O carpinteiro José teria esculpido uma imagem de Maria, sua esposa e mãe de Jesus Cristo. Depois de diversos percalços, esta imagem chegou até ao Mosteiro de Cauliniana, em Mérida, onde se encontrava refugiado o rei visigodo D. Rodrigo, após derrota contra os mouros na batalha de Guadalete em 711. Temendo o avanço dos seus inimigos, D. Rodrigo e Frei Romano, um dos monges do Mosteiro, decidem rumar a local mais seguro, transportando consigo relíquias e a imagem de Nossa Senhora.
Assim, o rei e o frei teriam chegado em 714 à região da Nazaré, mais exactamente ao monte de São Brás ou de São Bartolomeu. Optam por separar-se: D. Rodrigo fica no monte enquanto Frei Romano se estabelece numa elevação próxima, para onde leva a imagem e outras relíquias e onde constrói um nicho para depositar a figura de Nossa Senhora. Depois da morte do frei, D. Rodrigo decide partir para norte. No local, ficaria escondida a imagem de Nossa Senhora de Nazaré (1).
Avancemos quatrocentos e sessenta e oito anos: em 1182, numa manhã de nevoeiro, Dom Fuas Roupinho, alcaide-mor do castelo de Porto de Mós, lança-se na perseguição de um veado. De repente, surge à sua frente um precipício para o mar. A morte era certa. Em desepero, Dom Fuas recorda-se da imagem de Nossa Senhora da Nazaré que tinha descoberto tempos antes próximo do local e pede-lhe auxílio. E – milagre! – Nossa Senhora da Nazaré aparece a Dom Fuas, estancando as patas do seu cavalo e salvando-o assim de uma queda fatal.
Em honra deste milagre, Dom Fuas teria ordenado a construção da Ermida da Memória, junto ao precipício (2). A fama do milagre terá atraído peregrinos como D. Afonso Henriques e Vasco da Gama. O que é certo é que a popularidade da lenda e do milagre “explodiu” nos séculos XVII e XVIII, fenómeno atestado pela realização de Círios - grandes peregrinações colectivas ao Sítio da Nazaré vindas de diferentes pontos do País.
Durante o século XX, as peregrinações a este local diminuíram de forma substancial. A decadência do culto pode ser explicada pela instabilidade que se fez sentir depois da proclamação da República em 1910 e, a partir de 1917, devido à crescente popularidade do culto a Nossa Senhora de Fátima. Curiosamente, nos últimos anos com o desenvolvimento do turismo religioso, o culto à Senhora de Fátima acabaria por ter influência no aumento de visitas ao santuário da Senhora da Nazaré, em particular nos dias 13 de Maio, 13 de Outubro e no Verão.
No entanto, entre a lenda de Nossa Senhora da Nazaré e a verdade histórica existem grandes diferenças:
- a imagem de Nossa Senhora da Nazaré é trabalho de uma oficina regional e é datada do século XIV ou XV;
- Dom Fuas Roupinho terá sido uma figura imaginária, já que não existem documentos ou provas fidedignas que sustentem que tenha existido;
- a lenda de Nossa Senhora da Nazaré, tal como hoje a conhecemos, surge no século XVI pela mão de Frei Bernardo de Brito, monge de Alcobaça, com base em relatos orais das pessoas da região.
Mais recentemente, a lenda de Nossa Senhora da Nazaré viria a ser objecto da investigação do especialista em Sociologia das Religiões, Moisés Espírito-Santo. Em 2005, Moisés Espírito-Santo publicou o livro Cinco Mil anos de Cultura a Oeste, no qual defende que a tese de que esta lenda é, na verdade, um mito fenício com 3.500 anos (3).
Esta e outras teses de Moisés Espírito-Santo expostas no livro Cinco Mil anos de Cultura a Oeste têm suscitado polémica e discussão na região e nos meios académicos, mas até agora não foi refutada ou corroborada por outros investigadores. No entanto, para a população local que significado pessoal tem a Lenda de Nossa Senhora da Nazaré?
Talvez o verdadeiro significado e origem da lenda de Nossa Senhora da Nazaré ainda esteja por desvendar por completo. No entanto, o contributo de Moisés Espírito-Santo tem o inegável mérito de repensar a história desta região e, assim, de nos levar a viajar até ao Médio Oriente, ao berço da civilização Fenícia e, de nos levar a viajar no tempo até há mais 5 mil anos.
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É livre a reprodução para fins não comerciais, desde que o autor e a fonte sejam citados.
Citar como: Quico, Célia (2008) “Código Dom Fuas: qual o verdadeiro significado e origem da lenda de Nossa Senhora da Nazaré?”. Disponível em <http://nazare-portugal.blogspot.com/2008/06/cdigo-dom-fuas-qual-o-verdadeiro.html> acedido em (data).
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Notas:
(1) e (2) “Lenda de Nossa Senhora da Nazaré”, site Confraria de Nossa Senhora da Nazaré”. Disponível online em (consultado em 12-06-2006): http://www.cnsn.pt/portal/index.php?id=1195&layout=detail
(3) Espírito-Santo, Moisés (2005) Cinco Mil Anos de Cultura a Oeste: Etno-História da Religião Popular numa Região da Estremadura. Lisboa: Editora Assírio & Alvim
Fontes/ Bibliografia Científica:
Alão, Manuel de Brito (2001) Antiguidade da Sagrada Imagem de Nossa Senhora da Nazaré, edição de Pedro Penteado, Edições Colibri/ Confraria de Nossa Senhora da Nazaré.
Biti-Anat ,Lilinah trad. (1995-1997) “Epic of Baal: Part I: The Battle of Ba´al and Yahm”.Disponível online em (consultado em 06-12-2006): http://www.geocities.com/SoHo/Lofts/2938/baalyam.html
Espírito-Santo, Moisés (2005) Cinco Mil Anos de Cultura a Oeste: Etno-História da Regilião Popular numa Região da Estremadura, Assírio & Alvim.
Penteado, Pedro (1998) Peregrinos da Memória. O Santuário de Nossa Senhora de Nazaré 1600 – 1785, Centro de Estudos de História Religiosa da U.C.P.
Penteado, Pedro (200x) “A Lenda de Nossa Senhora da Nazaré”, site Câmara Municipal da Nazaré.Disponível online em (consultado em 10-06-2006): http://www.nazare.oestedigital.pt/custompages/showpage.aspx?pageid=48d53d58-0b11-41b8-86bb-c262c09723f8&m=b24
“Lenda de Nossa Senhora da Nazaré”, site Confraria de Nossa Senhora da Nazaré.Disponível online em (consultado em 12-06-2006): http://www.cnsn.pt/portal/index.php?id=1195&layout=detail
Assim, o rei e o frei teriam chegado em 714 à região da Nazaré, mais exactamente ao monte de São Brás ou de São Bartolomeu. Optam por separar-se: D. Rodrigo fica no monte enquanto Frei Romano se estabelece numa elevação próxima, para onde leva a imagem e outras relíquias e onde constrói um nicho para depositar a figura de Nossa Senhora. Depois da morte do frei, D. Rodrigo decide partir para norte. No local, ficaria escondida a imagem de Nossa Senhora de Nazaré (1).
Avancemos quatrocentos e sessenta e oito anos: em 1182, numa manhã de nevoeiro, Dom Fuas Roupinho, alcaide-mor do castelo de Porto de Mós, lança-se na perseguição de um veado. De repente, surge à sua frente um precipício para o mar. A morte era certa. Em desepero, Dom Fuas recorda-se da imagem de Nossa Senhora da Nazaré que tinha descoberto tempos antes próximo do local e pede-lhe auxílio. E – milagre! – Nossa Senhora da Nazaré aparece a Dom Fuas, estancando as patas do seu cavalo e salvando-o assim de uma queda fatal.
Em honra deste milagre, Dom Fuas teria ordenado a construção da Ermida da Memória, junto ao precipício (2). A fama do milagre terá atraído peregrinos como D. Afonso Henriques e Vasco da Gama. O que é certo é que a popularidade da lenda e do milagre “explodiu” nos séculos XVII e XVIII, fenómeno atestado pela realização de Círios - grandes peregrinações colectivas ao Sítio da Nazaré vindas de diferentes pontos do País.
Durante o século XX, as peregrinações a este local diminuíram de forma substancial. A decadência do culto pode ser explicada pela instabilidade que se fez sentir depois da proclamação da República em 1910 e, a partir de 1917, devido à crescente popularidade do culto a Nossa Senhora de Fátima. Curiosamente, nos últimos anos com o desenvolvimento do turismo religioso, o culto à Senhora de Fátima acabaria por ter influência no aumento de visitas ao santuário da Senhora da Nazaré, em particular nos dias 13 de Maio, 13 de Outubro e no Verão.
No entanto, entre a lenda de Nossa Senhora da Nazaré e a verdade histórica existem grandes diferenças:
- a imagem de Nossa Senhora da Nazaré é trabalho de uma oficina regional e é datada do século XIV ou XV;
- Dom Fuas Roupinho terá sido uma figura imaginária, já que não existem documentos ou provas fidedignas que sustentem que tenha existido;
- a lenda de Nossa Senhora da Nazaré, tal como hoje a conhecemos, surge no século XVI pela mão de Frei Bernardo de Brito, monge de Alcobaça, com base em relatos orais das pessoas da região.
Mais recentemente, a lenda de Nossa Senhora da Nazaré viria a ser objecto da investigação do especialista em Sociologia das Religiões, Moisés Espírito-Santo. Em 2005, Moisés Espírito-Santo publicou o livro Cinco Mil anos de Cultura a Oeste, no qual defende que a tese de que esta lenda é, na verdade, um mito fenício com 3.500 anos (3).
Esta e outras teses de Moisés Espírito-Santo expostas no livro Cinco Mil anos de Cultura a Oeste têm suscitado polémica e discussão na região e nos meios académicos, mas até agora não foi refutada ou corroborada por outros investigadores. No entanto, para a população local que significado pessoal tem a Lenda de Nossa Senhora da Nazaré?
Talvez o verdadeiro significado e origem da lenda de Nossa Senhora da Nazaré ainda esteja por desvendar por completo. No entanto, o contributo de Moisés Espírito-Santo tem o inegável mérito de repensar a história desta região e, assim, de nos levar a viajar até ao Médio Oriente, ao berço da civilização Fenícia e, de nos levar a viajar no tempo até há mais 5 mil anos.
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É livre a reprodução para fins não comerciais, desde que o autor e a fonte sejam citados.
Citar como: Quico, Célia (2008) “Código Dom Fuas: qual o verdadeiro significado e origem da lenda de Nossa Senhora da Nazaré?”. Disponível em <http://nazare-portugal.blogspot.com/2008/06/cdigo-dom-fuas-qual-o-verdadeiro.html> acedido em (data).
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Notas:
(1) e (2) “Lenda de Nossa Senhora da Nazaré”, site Confraria de Nossa Senhora da Nazaré”. Disponível online em (consultado em 12-06-2006): http://www.cnsn.pt/portal/index.php?id=1195&layout=detail
(3) Espírito-Santo, Moisés (2005) Cinco Mil Anos de Cultura a Oeste: Etno-História da Religião Popular numa Região da Estremadura. Lisboa: Editora Assírio & Alvim
Fontes/ Bibliografia Científica:
Alão, Manuel de Brito (2001) Antiguidade da Sagrada Imagem de Nossa Senhora da Nazaré, edição de Pedro Penteado, Edições Colibri/ Confraria de Nossa Senhora da Nazaré.
Biti-Anat ,Lilinah trad. (1995-1997) “Epic of Baal: Part I: The Battle of Ba´al and Yahm”.Disponível online em (consultado em 06-12-2006): http://www.geocities.com/SoHo/Lofts/2938/baalyam.html
Espírito-Santo, Moisés (2005) Cinco Mil Anos de Cultura a Oeste: Etno-História da Regilião Popular numa Região da Estremadura, Assírio & Alvim.
Penteado, Pedro (1998) Peregrinos da Memória. O Santuário de Nossa Senhora de Nazaré 1600 – 1785, Centro de Estudos de História Religiosa da U.C.P.
Penteado, Pedro (200x) “A Lenda de Nossa Senhora da Nazaré”, site Câmara Municipal da Nazaré.Disponível online em (consultado em 10-06-2006): http://www.nazare.oestedigital.pt/custompages/showpage.aspx?pageid=48d53d58-0b11-41b8-86bb-c262c09723f8&m=b24
“Lenda de Nossa Senhora da Nazaré”, site Confraria de Nossa Senhora da Nazaré.Disponível online em (consultado em 12-06-2006): http://www.cnsn.pt/portal/index.php?id=1195&layout=detail
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